sexta-feira, 13 de agosto de 2010

tic-tac



o nó do pai












- Mais... Repetiu. 
E tudo pareceu concentrar-se nesse "mais". 
Toda a energia. 
O entorno se diluiu
Desvaneceu-se.
- Mais... 
Acidental ou construído 
Tudo é
Desde o começo. 
O discurso, a imagem. 
Nada é concluído
No entanto 
A luz mais branda, os contornos... 
Como explicar isso? 
- Mais. Repetiu novamente.
Suspendeu a fala, o pensamento -
Viaja. Imagina. Voa bem longe! 
Como explicar isso?
Devagar soprou a fumaça
Que lentamente subia em espirais.
- Mais.






em nome do filho






O espírito das pedras

Aonde o mel escorre uma abelha vai e vem.

Com flavos cabelos nasceu Flávio.
Era noite fria, o vento fazia volta nos morros, os canaviais arrepiavam.
Longe, tristes bois puxavam outro carro.
No engenho o vapor da garapa esquentava o ar; o da cachaça os espíritos.
Um fio filtrado de luz tremeluziu no escuro sobre o espelho dos paroes.


Sob o céu azul aço puro de abril, a soca do arrozal a perder de vista, sua mãe partiu na boléia com o intermediário.
Com o paiol vazio e os paroes secos o irmão mais velho de Flávio o deixou na zona.
Seu pai endoideceu.


Pité, como foi chamado, dividiu as tetas da ama com uma serpente: Píton.
Aos doze anos amarrou as quatro patas de um touro depois de derrubá-lo na poeira do curral com os próprios punhos.
Ele me contou muitas estórias.
Seus olhos brilhavam em meio a espirais de douradas serpentes.
Da morte dizia que a alma vira cobra, que o corpo é a sepultura da alma e a alma é o tutano da espinha.

- Sou um ser equívoco - dizia. - Nascido do tempo. Meu pai é meu avô.

Morreu jovem.
Tenho-o vivo na memória. Vivo e morto alias. Agora e às portas do paraiso.
Sinto o seu gosto no cheiro da cachaça.
Quando o conheci ele era mecânico. De dia. À noite montava peças.

- A música comanda as pedras! - brincava.

Vi desenhos seus de criança: uma mulher ateando fogo numa vivenda...
Seus olhos emudeceram.
Filho pai e avô num só, pensei.

O tempo é uma abstração.



















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